sábado, 10 de março de 2012

A Morte de Tony no Zôo de São Paulo


Que estaria Tony a pensar com aquele ar de filósofo existencialista? Não certamente que, em algum momento, um animal racional estivesse tramando tirar a sua vida de forma tão cruel e sórdida. Entretanto, seu olhar fixo, braços cruzados, sentado conforme o seu costume, pressagiava que algo estaria por vir e não seria prazeroso. Pouco tempo depois de pensar, experimentaria ele a dor, um dos dois senhores que, no dizer de Bentham, sujeitam os animais racionais. Mas Tony era irracional!... 


Tony não era humano, mas o seu assassino dizem que sim. E estava prazerosamente envenenando Tony. Tudo começou no dia 24 de janeiro de 2004. Dia fatídico para Tony e alguns de seus iguais.

Trata-se de um problema que, talvez, deva ser resolvido pela filosofia. Quem na verdade é humano nessa história, Tony ou seu assassino? Tony de há muito vivia naquele Zôo levando alegria para as pessoas que o visitavam, ainda que não fosse a sua intenção, vez que não entendia as razões pelas quais levavam tanta gente a desejar olhar para ele, especialmente nos finais de semana e feriados. 

Estava preso naquele Zôo por ter praticado algum crime? Quanto tempo passaria ali sem a sua permissão? Desejara tantas vezes a liberdade! Sim, porque aquilo era tudo, menos liberdade. Algo como uma liberdade relativa, como gostam de dizer os humanos.

Sempre pensava se não seria atração por se parecer um pouco com eles, seus visitantes. Seriam seres de outro planeta? Por que eles andavam tão eretos e falavam tanto? Inclusive seu nome encontrava semelhança com alguns deles: Tony. Nancy, assim mesmo com Y, e seu igual Felipe, também foram alvos da trama assassina perpetrada por algum infeliz dos chamados humanos. Estes mesmos, aos quais Darwin, e seu evolucionismo tresloucado, dizia descenderem de Tony.


A notícia da morte de Tony, e de seus amigos, informa que os corpos das vítimas vão para museus e faculdades veterinárias para estudo ou empalhados para exposição. Exposição? Sim, exposição. Tony agora será alvo não mais da alegria dos humanos, mas talvez da reflexão deles mesmos de quão maldosos são. A diferença entre o que acontecia antes, quando era visitado em vida, e hoje, estudado, empalhado, é que não pode mais filosofar a sua existência precária e triste, nem entender a enorme distância que há entre os seus dessemelhantes assassinos e o Criador de todas as coisas.


Juscelino V. Mendes


Sobre a obra

Todas as manhãs, o tratador do Zoológico de São Paulo Vicente Lucas Soares ia ao recinto dos chimpanzés para alimentar os quatro animais que viviam ali. Assim que notavam sua aproximação com a bandeja cheia de frutas, verduras e ração, os macacos começavam a pular e a gritar. "Era uma festa", lembra Soares. No último dia 24, a recepção foi diferente. Todos pareciam mais quietos que de costume. Ao entrar na jaula de "Tony", um primata de 14 anos e 70 quilos, o tratador encontrou-o estirado no chão. Estava morto. Tony foi o primeiro de uma lista de dez bichos envenenados com raticidas nas duas semanas seguintes. As vítimas são mais dois chimpanzés, três antas, três dromedários e uma elefanta. Veja, 18-02-2004 - http://veja.abril.com.br/vejasp/180204/bichos.html

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Os assassinos até hoje não responderam por seus crimes bárbaros. Se é que haja algum crime que não o seja, mas tratando-se de animais indefesos... Neste conto filosófico e poético, a minha perene indignação!


Imagem de Tony: http://www.overmundo.com.br/uploads/banco/multiplas/1219286244_490pxmattiparkkonen_chimpanze1.jpg